ANTROPOTRÁGYKO – A coluna de Francisco Weyl
O CINEMA QUE VEM DA ESCOLA DO PORTO
A Teoria dos Magníficos Quadros Artísticos Cinematográficos (TMQAC) não nasce nos filmes realizados pela Escola do Porto mas sim na sua estruturação estética e na poética da relação do homem com a arte. Esta teoria, nesse sentido, define o homem. Tomada como um sintagma frasal, a TMQAC encerra uma sucessão (é, na verdade, uma associação, mas não uma livre associação) de conceitos articulados que se fundem (de forma não espontânea) em um único conceito, artístico por excelência
Apesar de ser formada por realizadores que estudaram na Escola Superior Artística do Porto, a auto denominada Escola do Porto não é uma instituição, mas sim uma articulação de pessoas que tem como base um princípio estético artístico definido. Estas pessoas, entretanto, mesmo sem se auto afirmarem como tal, têm inspirações anárquicas: sem obedecer a regras específicas, expressam-se a si próprios através de suas produções (individuais ou colectivas) e expressam a filosofia desta Escola do Porto em suas obras artísticas.
A Escola do Porto tem o cinema como fundamento mas expande-se ao universo artístico, atingindo concepções filosóficas que definem uma concepção de existência. Neste sentido, a Escola do Porto aprofunda as relações entre os seres humanos, remetendo-os para a sua própria consciência, a consciência do ser, e também para uma relação mais profunda com a existência, atingindo uma perspectiva nietzschiana em que ao artista criador não interessa o que ele faz mas sim o que é e o que afirma da coisa que é ou pensa ser.
A Teoria dos Magníficos Quadros Artísticos Cinematográficos (TMQAC) não nasce nos filmes realizados pela Escola do Porto mas sim na sua estruturação estética e na poética da relação do homem com a arte. Esta teoria, nesse sentido, define o homem. Tomada como um sintagma frasal, a TMQAC encerra uma sucessão (é, na verdade, uma associação, mas não uma livre associação) de conceitos articulados que se fundem (de forma não espontânea) em um único conceito, artístico por excelência.
Se a TMQAC é um conceito uno que resulta de uma sucessão/associação de conceitos e se tais conceitos, unificados, definem a TMQAC, a qual define a Escola do Porto, não se poderá dizer que a Escola do Porto possua apenas uma teoria dos MQAC. A Escola do Porto tem tantas teorias dos magníficos quadros artísticos cinematográficos quantos forem os realizadores que as defendam. Alguns destes realizadores teorizam quando conversam e filmam (ou mesmo quando sonham com seus filmes ou apenas os imaginam), outros a teorizam quando escrevem sobre ela.
A Escola do Porto assenta-se num universo de contradições. Seus teóricos não estão à disposição dos críticos para justificar seus pensamentos, os quais, apesar de profundos, enraizados em concepções artísticas e filosóficas, nascem para ser destruídos, não defendidos. Anti teóricos por princípio, os realizadores da Escola do Porto são leitores de Nietzsche, Baudelaire, Pascoaes e Glauber. Qualquer realizador da Escola do Porto quer apossar-se de uma estrutura para destruí-la. É a isso que se propõe a Escola do Porto: uma ruptura com o establishment e um resgate dos princípios mais simples da arte.
Uma teoria, se pressupõe uma técnica para se tornar em uma praxis (articulando/justapondo teoria e prática) não pode esvaziar-se nos próprios conceitos que cria e aprofunda: o passo à praxis não requer uma perda de objectivação de resultados nem um praticismo sem sentido, ao contrário, concretiza-se com bases e fundamentos teóricos, os quais, reelaborados e praticadas, atingem a praxis.
Mais que uma teoria, a TMQAC é uma praxis expressa em filmes, sejam eles realizados ou não; sejam eles realizados em quaisquer suportes, em película ou em vídeo, deverão ser considerados filmes; e mesmo que eles, os filmes, não sejam realizados a posteriori, haverão de ser realizados a priori, portanto, serão sempre filmes, quer ainda dentro de uma ideia na cabeça de um criador, portanto, em imagens conscientes e inconscientes, ou então como resultado traduzido em imagem (e/ou som), projectados ou não em película ou no vídeo.
Os filmes que se realizam a priori já são filmes porque contém em si a imagem pura. Paradoxalmente bruta, porque presa ao imaginário de seu criador, tal qual uma escultura ainda oculta sob a pedra mas já desenhada e definida (realizada) na cabeça do escultor. Paradoxalmente bruta e abstracta, porque imagética, imaginável, e, como tal, pré-realizada, mas já realizada.
Esta é a dinâmica do filme que se realiza a priori, do filme que nasce feito na ideia de seu artífice. Se será ou não realizado, se será ou não processado, tornado argumento, texto, imagem, montagem, já o será a posteriori.
O homem também é uma máquina capaz de filmar com os seus olhos ou com os seus sonhos. O homem, como máquina, é técnica, possui funções e instrumentos, suportes e estruturas, força e movimento, além de outras qualidades e atributos capazes de registar uma imagem em sua memória. Mas o homem também é coração.
A TMQAC, mais que uma teoria, é uma praxis que absorve mas ultrapassa tais fenómenos, condenando-os e condensando-os ao campo da técnica. A técnica é apenas um instrumento (ou uma ferramenta) que deve ser usada pelo artista. A evolução técnica é resultado do crescimento cultural do homem. Ao submeter a sua capacidade de construir a esta evolução o homem tornou-se vítima de sua própria armadilha. O artesão agora já não usa mais a mão.
Esta praxis de fundamentação teórica que se realiza no cinema – na qualidade de arte da imagem em movimento -, esta TMQAC não tange discursos e conflitos histéricos sobre o fazer cinematográfico, como por exemplo a continuidade ou o fim do cinema como arte ou o conflito entre cinema digital e cinema de película. Se é filme ou vídeo, película ou digital, esta polémica sobre o cinema é pequena diante, por exemplo, da possibilidade de se realizar um filme sem câmara, apenas com os olhos
http://www.liberal-caboverde.com/noticia.asp?idEdicao=64&id=7130&idSeccao=527&Action=noticia
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...Escrito por Francisco Weyl
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